(palavras) (natureza sábia)
à Ana I., aos círculos e à esperança dos tempos
Quando a serpente muda de pele, os ecos ressoam mais alto.
Tudo se sente, mais. Por tudo se ansia, mais. Quando a serpente muda de pele,
as cores gritam mais alto. Tudo se revela. Mais. Tudo magoa. Mais.
Rasteira. Fuligem. Poeira que se transforma em furacão em
cada partícula de si.
Larga serpente. Largar de deixar ir. Larga serpente. Largar
de deixar ser. E quando o ser é fininho, cru e à mostra, reclama-se a ternura
do esconderijo. Reclama-se o aconchego da reflexão e a carícia do recomeço.
Não é abandono serpente. É cura. É medicina. Não é desonra
serpente. É lealdade. É antídoto. Não é pecado serpente. É salvação. É
origem.
É a dor daquilo que já não é para ser. É a profecia daquilo
que existe em ti. É o susto e é a surpresa. É o formigueiro da dormência e e são
as cócegas na barriga. Do canto. Da serpente. Da antecipação.
Desprende. Porque não é o fim serpente. É a alma que vinga
por pertencer à lua. Desprende. Porque não é mito serpente. É a história que
renasce por amor às nossas raízes. Porque entre as rosas e os espinhos,
senhora, és santa. Porque a inocência, serpente, é a tua. Tenra, frágil,
sensível. E na cura a perdes e na cura a encontras.
Larga. A pele que já foi. Vazia. Abençoa-a. Deixa vir. A
pele que há de ser. Repleta. Envolve-te. Deitada por terra, fica. Deitada na
terra, deixa-te ir.
por Ana Sevinate
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